A história por trás da cena mais polêmica do cinema ganha novos contornos no filme “Meu nome é Maria”

"Meu nome é Maria", novo longa estrelado por Matt Dillon e Anamaria Vartolomei, resgata a trajetória de Maria Schneider — atriz que viveu um dos episódios mais controversos do cinema ao participar do filme Último Tango em Paris (1972), de Bernardo Bertolucci. A produção ficou marcada pela infame "cena da manteiga", improvisada por Marlon Brando e Bertolucci sem o consentimento prévio de Schneider, que na época tinha apenas 19 anos.
O impacto desse momento se estendeu por décadas. Schneider lidou com dependência química, crises de saúde mental e o peso de uma fama indesejada. O novo longa, dirigido por Jessica Palud, busca contar essa história pela ótica da própria atriz, mostrando o trauma que moldou sua vida e carreira. A diretora baseou o roteiro no livro da jornalista Vanessa Schneider, prima de Maria.
"Foi uma experiência muito traumática para ela", afirmou Matt Dillon à BBC. "E não apenas no momento em que aconteceu, mas porque continuou a persegui-la e assombrá-la ao longo da vida."
Na época das filmagens, Schneider revelou que não sabia o que enfrentaria naquele dia de gravação. "Essa cena não estava no roteiro original. A verdade é que foi Marlon quem teve a ideia… Me senti humilhada e, para ser sincera, me senti um pouco estuprada, tanto por Marlon quanto por Bertolucci", contou em uma entrevista de 2007. A atriz também relatou que Brando não a confortou após a cena e que sua reação — em lágrimas — foi real.
O diretor, por sua vez, afirmou anos depois que queria "uma reação de garota, não de atriz", justificando a falta de aviso como uma estratégia artística. Dillon discorda: "Foi muito errado, em uma cena tão delicada, fazer algo assim".
A nova produção refaz a cena sob outra perspectiva — a de Maria. Dessa vez, com o suporte de um coordenador de intimidade, técnica cada vez mais presente em sets após o movimento #MeToo. Ainda assim, a recriação mexeu com a atriz Anamaria Vartolomei: "Essa cena foi realmente violenta… Eu estava apenas atuando, mas Maria viveu aquilo de verdade. E sozinha".
Apesar do reconhecimento tardio, Schneider nunca deixou de falar sobre o que sofreu. Para a diretora Palud, isso a torna ainda mais marcante: "Naquela época, muitas atrizes se calavam. Maria falava, mas não era ouvida".
A recepção ao Último Tango em Paris na década de 1970 contrasta com a vivência da atriz. O filme arrecadou milhões, levou Brando e Bertolucci ao Oscar, enquanto Schneider recebeu apenas US$ 4 mil e a pecha de "símbolo sexual" — algo que ela dizia não ser. "Todo o escândalo e desdobramentos do filme me deixaram um pouco louca, e tive um colapso", contou anos depois.
A crítica atual sobre o longa reacendeu após a repercussão de uma entrevista de Bertolucci, em 2013, admitindo que queria provocar uma reação real de humilhação em Schneider. O escândalo voltou à tona e reforçou questionamentos sobre os limites éticos da direção de atores — especialmente em contextos de poder e gênero.
"Hoje temos mais proteção, nossa voz é ouvida", diz Vartolomei. Já a diretora Jessica Palud ressalta que o objetivo do filme é expor o sistema que permitia esse tipo de prática: "Não queria julgar, mas mostrar o que precisa mudar".
Em um cenário onde os bastidores de grandes obras estão sendo revistos com um olhar mais crítico, Meu nome é Maria se propõe a dar espaço a uma voz que por muito tempo foi ignorada — mas que nunca deixou de tentar ser ouvida.
Assista ao Trailer abaixo: