Jimmy Page se manifesta contra proposta de lei sobre IA e direitos autorais no Reino Unido

O guitarrista Jimmy Page publicou uma nota pública criticando duramente uma proposta de lei que tramita no Reino Unido, relacionada ao uso de inteligência artificial no mercado musical. A medida abriria caminho para que empresas de tecnologia tivessem acesso completo a obras musicais protegidas por direitos autorais, com o objetivo de treinar suas plataformas de IA.
O tema tem causado polêmica entre artistas e profissionais da música. Nomes de peso como Paul McCartney, Bjorn Ulvaeus (Abba) e Ed Sheeran já expressaram posicionamentos contrários. Além disso, cerca de mil músicos britânicos, incluindo Kate Bush, Damon Albarn e Annie Lennox, lançaram recentemente o álbum colaborativo "Is This What We Want?", composto por faixas completamente silenciosas, como forma de protesto.
No sábado (1º), foi a vez de Jimmy Page usar suas redes sociais para comentar o assunto. O guitarrista do Led Zeppelin publicou um longo texto no qual defende a criação artística humana e questiona os impactos do uso de IA na música.
Ele abriu a mensagem com uma provocação direta: "Lutaremos pela magia insubstituível da arte humana?". Ao longo da nota, Page relembrou seu próprio percurso como músico de estúdio e integrante de uma das maiores bandas de rock do mundo. Segundo ele, a música criada por humanos carrega emoções, histórias e imperfeições que as criações de IA não conseguem reproduzir.
Para o guitarrista, as inteligências artificiais acabam se alimentando de obras humanas pré-existentes, gerando conteúdos sem "consentimento, atribuição ou compensação". E, em vez de favorecer as máquinas, Page defende a criação de políticas que realmente protejam os artistas.
Na íntegra, ele escreveu:
"Nos estúdios em Londres do início dos anos 1960, aperfeiçoei minha arte como músico de estúdio, emprestando minha guitarra a uma infinidade de artistas de diversos gêneros. Aqueles incontáveis momentos, quando muitas vezes eu fazia três sessões de três horas por dia, eram mais do que apenas trabalho: envolviam também criatividade, colaboração e inspiração contínua.
Eu precisava criar e conceber riffs e melodias rapidamente, sem interromper o fluxo do trabalho que estava sendo gravado com os outros músicos e o artista. Essa jornada do anonimato do trabalho de estúdio aos palcos globais com o Led Zeppelin não foi traçada por algoritmos ou bancos de dados. Foi uma trajetória marcada pela improvisação e pelo brilho incalculável da engenhosidade humana. A alquimia que transformava um riff em um hino vinha da alma coletiva da banda — uma sinergia que nenhuma máquina pode reproduzir.
Hoje, à medida que a inteligência artificial busca imitar e monetizar a criatividade, estamos diante de uma encruzilhada. A arte e a música geradas por IA, sintetizadas a partir de obras humanas preexistentes, carecem da essência visceral que nasce da experiência vivida. Não passam de ecos vazios, sem as lutas, triunfos e a alma que definem a verdadeira arte. Além disso, as implicações éticas são profundas. Quando a IA vasculha a criatividade humana para gerar conteúdo, muitas vezes o faz sem consentimento, atribuição ou compensação. Isso não é inovação; é exploração.
Se, nos meus tempos de músico de estúdio, alguém tivesse usado meus riffs sem reconhecimento ou pagamento, isso teria sido considerado roubo. O mesmo princípio deve se aplicar à IA. Precisamos defender políticas que protejam os artistas, garantindo que seu trabalho não seja sugado pelas máquinas sem a devida consideração. Celebremos e preservemos o toque humano na arte — as imperfeições, as emoções, as histórias por trás de cada nota e cadência. Ao defender a santidade da criatividade humana contra o avanço da IA, protegemos não apenas os direitos dos artistas, mas a própria alma do nosso patrimônio cultural."
O álbum silencioso de protesto
Um dos protestos mais criativos ligados a essa proposta de lei foi o lançamento do álbum "Is This What We Want?", que reúne gravações de estúdios vazios — sem som algum — como uma crítica direta à possível liberação do uso de músicas protegidas por IA. Cerca de mil artistas britânicos assinam o material, entre eles Kate Bush, que gravou uma das faixas em seu próprio estúdio.
A cantora também deixou um recado curto, publicado pelo site MusicRadar: "Na música do futuro, nossas vozes não serão ouvidas?".
O lançamento aconteceu na última terça-feira (25), justamente o dia final da consulta pública sobre a proposta. Além dos artistas já mencionados, o álbum conta com colaborações de Hans Zimmer, Tori Amos e muitos outros.
A sequência de títulos das 12 faixas forma a frase: "The British government must not legalise music theft to benefit AI companies" (O governo britânico não pode legalizar o roubo de música para beneficiar empresas de IA).
Toda a renda arrecadada com o projeto será destinada a uma instituição que apoia artistas em dificuldades financeiras.